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2011 – Ano Internacional das e dos Afrodescendentes

Ban Ki-moonMensagem do Secretário-Geral, Ban Ki-moon, por ocasião do Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial

Todos os anos o mundo rememora o aniversário do massacre de Sharpville de 1960, em que dezenas de manifestantes pacíficos foram mortos a tiros pela polícia sul-africana do apartheid porque protestavam contra as leis discriminatórias em função da raça.

Este ano, o Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial está consagrado a combater a discriminação de que são objeto os afrodescendentes. Elegemos este tema para refletir sobre a proclamação da Assembleia Geral das Nações Unidas de 2011 como Ano Internacional dos Afrodescendentes.

A discriminação contra os afrodescendentes é prejudicial. Em geral, estão presos à pobreza devido à intolerância, e se utiliza a pobreza como pretexto para excluí-los ainda mais. Muitas vezes, eles não têm acesso à educação por causa dos preconceitos, e logo a instrução insuficiente é alegada como motivo para negar-lhes postos de trabalho. Essas e outras injustiças fundamentais têm uma longa e terrível história, compreendida pelo tráfico de escravos transatlântico, cujas consequencias são sentidas ainda hoje.

Há uma década em Durban, a Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Conexas de Intolerância aprovou um amplo programa de luta contra o racismo com visão de futuro em que figurava em destaque o fomento da plena participação dos afrodescendentes na sociedade. O Ano Internacional oferece a oportunidade de avançar neste combate e de reconhecer as vastas contribuições dos afrodescendentes ao desenvolvimento político, econômico, social e cultural de todas as nossas sociedades.

Para derrotar o racismo temos que acabar com as políticas públicas e as atitudes privadas que o perpetuam. Neste Dia Internacional, faço um chamamento aos Estados Membros, às organizações internacionais e não-governamentais, aos meios de comunicação, à sociedade civil e a todas as pessoas para que participem ativamente na promoção do Ano Internacional dos Afrodescendentes e combatam conjuntamente o racismo quando e onde ele surja.

O legado da “porta sem retorno”

Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Navi Pillay. Foto: ONU.(*) Por Navi Pillay, Alta Comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas.

Visitei recentemente a Ilha de Gorée, no Senegal, a infame “porta sem retorno” pela qual inúmeros africanos foram enviados acorrentados para as Américas durante o tráfico transatlântico de escravos. À medida que eu percorria a ilha onde milhares de seres humanos foram negociados como mercadorias, fiquei particularmente sensibilizada com o fato de que a Assembleia Geral das Nações Unidas tenha proclamado 2011 como o Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes. No centro desta iniciativa está a promoção dos direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos das pessoas de ascendência africana, bem como sua participação e integração em todos os aspectos da sociedade.

Uma primeira oportunidade para isto é a celebração anual do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, comemorado no dia 21 de março. Esta data foi escolhida porque marca o massacre ocorrido em 1960, quando 69 manifestantes foram assassinados durante um protesto pacífico contra o regime do apartheid em Sharpeville, na África do Sul. O Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial é um lembrete anual de que devemos agir de maneira mais decisiva no combate ao racismo, à discriminação e à intolerância. O crescente número de incidências em várias partes do mundo prova que um maior comprometimento com a implementação plena e eficaz dos direitos humanos internacionais para combater estes flagelos é extremamente necessário.

Diferente das comemorações anteriores, o Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial deste ano tem um foco especial nas pessoas de ascendência africana para destacar a exclusão e a marginalização, que persistem. Muitas destas pessoas são descendentes das vítimas do tráfico transatlântico de escravos, uma das maiores manchas na consciência humana.

As estatísticas confirmam a dimensão deste crime contra a humanidade. Apesar das informações variarem devido à falta de documentação precisa, estima-se que cerca de 14 milhões de africanos foram levados às Américas como escravos, e mais 14 milhões foram levados ao Oriente.

Só nas Américas, o número de afrodescendentes ultrapassa 200 milhões e muitos deles vivem sob terríveis circunstâncias. Eles estão frequentemente entre os mais afetados pela pobreza, desemprego e condições precárias de vida. Este não é um mero acidente do destino. Precisamos reconhecer que na raiz desta deplorável realidade está a discriminação estrutural, que teve origem em lugares como a Ilha de Gorée.

De fato, o legado do comércio de escravos persiste em muitas práticas atuais. Vemos reflexos da discriminação contra afrodescendentes na discriminação racial, na representação excessiva na população carcerária e no acesso precário aos serviços de educação, justiça e saúde de qualidade. Por causa destes obstáculos, gerados pelo preconceito, pela intolerância e pela desigualdade, milhares de pessoas têm seus direitos humanos negados.

Recentemente, em abril de 2009, na Conferência de Revisão de Durban contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e as Formas Correlatas de Intolerância, 182 Estados concordaram que uma renovação dos compromissos era necessária para combater estes flagelos.

Enquanto as celebrações da ONU oferecem oportunidades para discutir e abordar os diversos desafios que os afrodescendentes continuam enfrentando devido ao racismo e à discriminação racial, elas também fornecem plataformas de alto nível para expor e comemorar as inúmeras contribuições em todas as áreas do esforço humano. Nas artes e na ciência, no direito e na política, pessoas de ascendência africana têm imprimido sua marca na história, moldado nações e avançado os mais altos ideais de liberdade, progresso, superação, indústria e autoconfiança.

Em muitos casos, porém, os livros de história, os currículos escolares e as tradições orais não refletem a riqueza e a extensão do patrimônio, do trabalho e das realizações dos afrodescendentes. Essas lacunas intencionais ou negligenciadas devem ser preenchidas pelas narrativas de lutas, dor e sucesso que pertenciam exclusivamente às pessoas de ascendência africana e sua experiência contínua.

Espero que 2011 gere discussões profundas em relação aos desafios enfrentados pelos afrodescendentes, e que forneça múltiplas instâncias onde possam ser encontradas propostas e soluções inovadoras para lidar com este desafios.

Peço a todas as pessoas de boa vontade que assegurem que os Estados e comunidades em todo o mundo respeitem os direitos humanos internacionais. Vamos fazer com que nosso objetivo neste Dia Internacional para a Eliminação seja o de expressar solidariedade com as pessoas de ascendência africana e gerar soluções para suas condições, aspirações e seus direitos a uma vida digna e próspera.

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(*) Navi Pillay é Alta Comissária de Direitos Humanos das Nações Unidas.

Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes 2011

Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes 2011; clique aqui para acessar a página oficial do AnoUm ano dedicado aos afrodescendentes

“Este Ano Internacional oferece uma oportunidade única para redobrar nossos esforços na luta contra o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e outras formas de intolerância que afetam as pessoas de ascendência africana em toda parte.”
(Navi Pillay, Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos)

Estima-se que 200 milhões de pessoas que se identificam como sendo de ascendência africana vivem nas Américas. Muitos outros milhões vivem em outras partes do mundo, fora do continente africano. Ao proclamar o Ano Internacional, a comunidade internacional está reconhecendo que as pessoas de ascendência africana representam um grupo específico da sociedade, cujos direitos humanos devem ser promovidos e protegidos.

As pessoas de ascendência africana são reconhecidas na Declaração e no Programa de Ação de Durban [1] como um grupo de vítimas específicas que continuam sofrendo discriminação, como legado histórico do comércio transatlântico de escravos. Mesmo afrodescendentes que não são descendentes diretos dos escravos enfrentam o racismo e a discriminação que ainda hoje persistem, gerações depois do comércio de escravos.

Para corrigir os erros do passado

“Este é o ano para reconhecer o papel das pessoas de ascendência africana no desenvolvimento global e para discutir a justiça para atos discriminatórios correntes e passados que levaram à situação de hoje”
(Mirjana Najcevska, Presidente do Grupo de Trabalho das Nações Unidas de Peritos sobre Pessoas de Ascendência Africana)

As manifestações de discriminação racial que foram a base do comércio de escravos e da colonização ainda ressoam hoje. O racismo pode se manifestar de diversas maneiras, às vezes sutilmente, às vezes inconscientemente, mas sempre resultando na violação das pessoas de ascendência Africana.

Para encontrar formas de combater o racismo, a ex-Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos criou, em 2001, o Grupo de Trabalho de Peritos sobre Pessoas de Ascendência Africana, encarregado studar os problemas de discriminação racial enfrentados por pessoas de ascendência africana que vivem na diáspora e fazer propostas para a eliminação da discriminação racial contra africanos e seus ascendentes em todo o mundo.

O Grupo de Trabalho concluiu que alguns dos mais importantes desafios que enfrentam as pessoas de ascendência africana dizem respeito à representação, e tratamento, na administração da justiça e no seu acesso à educação, emprego, saúde e habitação, muitas vezes devido à discriminação estrutural que está incorporada dentro das sociedades.

Em alguns países, especialmente naqueles onde as pessoas de ascendência africana constituem minoria, elas recebem sentenças mais severas e constituem parte desproporcionalmente alta da população carcerária. O enquadramento racial [2] – que resulta na sistemática perseguição de pessoas de ascendência africana por policiais – criou e perpetuou grave estigmatização e estereótipos dos afrodescendentes como dotados de uma propensão à criminalidade.

Em muitos países, afrodescendentes tem menos acesso à educação de qualidade em todos os níveis. Evidências mostram que, quando as pessoas de ascendência africana têm maior acesso à educação, encontram-se em melhores condições de participar de aspectos políticos, econômicos e culturais da sociedade e defender seus próprios interesses.

Povos Afrodescendentes no Chile. Foto: ACNUDH.
Povos Afrodescendentes no Chile. Foto: ACNUDH.

O Grupo de Trabalho salienta que a coleta de dados desagregados com base na etnia é um aspecto importante de abordagem dos direitos humanos de afrodescendentes. As políticas de governo para combater o racismo e a discriminação não podem ser corretamente formuladas, muito menos aplicadas, se essa informação não estiver disponível. Nem pode seu progresso ser avaliado.

A Campanha Global

Navi Pillay, Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos“O Ano Internacional deve se tornar um marco na campanha em curso para promover os direitos das pessoas de ascendência africana. Merece ser acompanhada de atividades que estimulem a imaginação, aprimorem nossa compreensão da situação das pessoas de ascendência africana e seja um catalisador para uma mudança real e positiva na vida diária de milhões de pessoas ao redor do mundo.”
(Navi Pillay, Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos)

A Assembleia Geral da ONU proclamou 2011 como o Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes [3], citando a necessidade de fortalecer as ações nacionais e a cooperação internacional e regional para assegurar que as pessoas de ascendência africana gozem plenamente de direitos econômicos, culturais, sociais, civis e políticos. O Ano visa ainda promover a integração de pessoas de ascendência africana em todos os aspectos políticos, econômicos, sociais e culturais da sociedade, e promover maior conhecimento e respeito pela sua herança e cultura diversificadas. O Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes foi lançado no Dia dos Direitos Humanos, 10 de dezembro de 2010, pelo Secretário-Geral da ONU, Ban Ki-moon.

O principal objetivo do Ano é aumentar a consciência dos desafios que as pessoas de ascendência africana enfrentam. Espera-se que o Ano promova discussões capazes de gerar soluções para enfrentar este desafio.

Durante 2011, diversos eventos internacionais serão realizados. Em 2 de março, em Genebra (Suíça), um painel de discussão com a participação dos Estados-Membros e da sociedade civil abordará as questões de direitos humanos das pessoas de ascendência africana durante a Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Nesta mesma semana, em 7 de março, uma rodada de discussões será realizada pelo Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial, também em Genebra. Essas discussões servirão para aumentar a conscientização sobre as causas e consequências da discriminação racial contra as pessoas de ascendência africana e promover a visibilidade de seus diversificados patrimônio e cultura.

Também em março, o Grupo de Peritos sobre Pessoas de Ascendência Africana vai discutir o Ano Internacional. Esta reunião será realizada em Genebra de 28 de março a 1º de abril. O Ano Internacional será encerrado com a convocação de um debate de alto nível sobre as conquistas das metas e dos objetivos do Ano, realizado em Nova York em setembro, durante a sessão ordinária da Assembleia Geral da ONU.

Uma coalizão de organizações da sociedade civil criada para promover o Ano realizará memoriais, seminários, eventos culturais e outras atividades ao redor do mundo para marcar o Ano e sensibilizar a opinião pública sobre a contribuição dos descendentes de africanos ao patrimônio mundial. Todos, e em particular as próprias pessoas de ascendência africana, são encorajados a participar e contribuir para o sucesso do Ano.

A resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o Ano Internacional também incentiva os Estados-Membros e todos os doadores relevantes a contribuir com fundos para as atividades durante o ano.

Visite a página do Grupo de Trabalho de Peritos sobre Pessoas de Ascendência Africana clicando aqui.

Abaixo, assista à mensagem de Navi Pillay, Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, por ocasião do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, em 21 de março de 2011:

Sobre o Escritório de Direitos Humanos da ONU

Escritório de Direitos Humanos da ONU (ACNUDH)O Escritório de Direitos Humanos da ONU, que faz parte do Secretariado da ONU, cumpre o mandato único de promover e proteger todos os direitos humanos. Sediado em Genebra, também está presente em 50 países.

Chefiado pela Alta Comissária dos Direitos Humanos, cargo criado pela Assembleia Geral em 1993 para liderar os esforços da ONU em direitos humanos, age com base no mandato dado pela comunidade internacional para proteger e defender os direitos humanos universais. Para obter mais informações, visite www.ohchr.org e www.acnudh.org

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[1] Adotada na Conferência Mundial de 2001 contra o Racismo, em Durban, África do Sul, a Declaração e o Programa de Ação de Durban foram um documento abrangente e orientam a ação que propõe medidas concretas para combater o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e demais formas relacionadas de intolerância.

[2] A Declaração e o Programa de Ação de Durban definem o enquadramento racial como “a prática de policiais e de cumprimento da lei, em qualquer grau, baseados na raça, cor, ascendência ou origem nacional ou étnica, como meio de submeter as pessoas a atividades de investigação ou para determinar se um indivíduo está envolvido em atividades criminosas.”

[3] Na resolução 64/169.

Acesse a resolução da Assembleia Geral que proclama 2011 o Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes:

Abaixo, vídeo do lançamento do Ano (em inglês), informações em português aqui: