Carta aberta: Tolerância Zero das Nações Unidas em matéria de abusos no Haiti

Organização das Nações Unidas (ONU)Mariano Fernández
Representante Especial do Secretário-Geral da ONU no Haiti
Chefe da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH)

Nos surpreendeu e entristeceu profundamente ter conhecimento, há cerca de dez dias, de que alguns soldados da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH) teriam tido um comportamento abusivo e degradante com um jovem haitiano.

Desde 2004, a MINUSTAH trabalha intensamente com as autoridades do Haiti para estabilizar o país, fortalecer suas instituições e consolidar o Estado de Direito e, portanto, os direitos econômicos e sociais dos cidadãos haitianos.

Nas Nações Unidas, atua-se com uma política de “Tolerância Zero”, no que se refere ao não cumprimento das obrigações e do respeito das normas de conduta que se esperam de um funcionário internacional. O respeito absoluto da dignidade e da soberania dos povos dos países anfitriões, das tradições e da cultura estão entre essas obrigações.

Assim que fomos informados de que os soldados poderiam ter cometido alguns atos abusivos graves contra um cidadão haitiano na região de Port-Salut, tomamos decisões drásticas.

Em primeiro lugar, abrimos uma investigação preliminar para reunir e preservar todas as provas e elementos relacionados a este incidente.

A meu pedido, meu Comandante da Força ordenou o confinamento imediato dos soldados envolvidos no incidente em seus quartéis, para evitar que tivessem alguma influência no desenvolvimento da investigação.

Paralelamente, o caso foi encaminhado imediatamente à Missão Permanente do Uruguai junto às Nações Unidas em Nova York, pois, segundo os acordos que regem as relações entre a ONU e os países contribuintes de tropas nas missões de manutenção de paz, são as autoridades destes países e não a MINUSTAH as responsáveis por esclarecer estas alegações. De fato, uma equipe uruguaia de investigadores chegou ao Haiti no dia 4 de setembro. A investigação segue em curso.

Acolhemos a humilde e digna carta do Presidente do Uruguai ao Presidente Martelly pela qual o primeiro, em seu nome e em nome do Uruguai e de seu povo, pede perdão às autoridades e ao povo do Haiti pelos abusos cometidos por alguns soldados. Também recebemos com satisfação o compromisso firme e a ação imediata por parte do Ministro de Defesa do Uruguai neste sentido, bem como a decisão do Comando das Forças Armadas uruguaias de afastar o Comandante da Unidade Naval em Port-Salut de seu cargo. Apreciamos também a determinação das autoridades uruguaias de levar adiante a investigação dos fatos até as últimas consequências, e de aplicar as penas máximas de acordo com a responsabilidade de cada um dos soldados envolvidos.

De nossa parte, estamos realizando um seguimento com o país de origem dos suspeitos para assegurar, se necessário, que os soldados sejam levados à justiça e as sanções apropriadas sejam impostas.

As Nações Unidas têm igualmente uma estratégia de apoio às vítimas da exploração e dos abusos sexuais, a qual pensamos colocar em prática.

Estamos profundamente indignados. Tais atos são imperdoáveis e mancham a imagem da MINUSTAH. Mas os atos de poucos não devem manchar também os de milhares de funcionários militares, policiais e civis que servem a MINUSTAH e o Haiti de maneira impecável desde 2004.

Mariano Fernández
Representante Especial do Secretário-Geral da ONU no Haiti
Chefe da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH)