“O diálogo é o caminho” – Artigo de Irina Bokova, Diretora-Geral da UNESCO

Irina Bokova, Diretora-Geral da UNESCO (*)

A humanidade está em uma encruzilhada histórica. Por um lado contabiliza os resultados positivos da globalização, que revolucionou o intercâmbio entre povos, nações e culturas e, em alguns países, ajudou milhões de pessoas a sair da condição de pobreza. Países emergentes como o Brasil conseguiram, durante a última crise mundial, manter crescimento econômico positivo e melhoria na distribuição de renda. O País já atingiu um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da ONU de, até 2015, reduzir pela metade a pobreza extrema, embora ainda conviva com uma das mais altas taxas de desigualdade do mundo.

Por outro lado, a globalização gerou um clima de incompreensão e desconfiança, agravado por uma crise global de ordem não apenas econômica e financeira, mas social, ambiental, moral e ética. Entre seus efeitos perversos está a tendência de homogeneização do mundo, ameaçando a rica diversidade cultural do planeta.

O Relatório Mundial “Investindo na Diversidade Cultural e no diálogo intercultural”, que é tema de um debate promovido pela UNESCO no Rio de Janeiro, traz novas luzes sobre o tema e sua relação com as políticas sociais e de desenvolvimento. Avançamos na compreensão da diversidade como fenômeno dinâmico e multidimensional, que não pode ser engessado e deve ser incorporado como direito e princípio básico das estratégias de desenvolvimento.

A integração da diversidade cultural às políticas públicas pode contribuir para que a comunidade internacional aborde com uma nova perspectiva objetivos de fundamental importância não só para o desenvolvimento, mas também para a edificação da paz e a prevenção de conflitos. A diversidade é um elemento transversal dos três pilares do desenvolvimento verdadeiramente sustentável, o econômico, o social e o ambiental.

Como destaca a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, de 2001, a diversidade cultural é tão necessária para a humanidade quanto a biodiversidade para a natureza. Ou seja, é patrimônio comum da humanidade e deve ser reconhecida e promovida em benefício das gerações atuais e futuras.

O diálogo intercultural é o caminho para desatarmos os nós das tensões identitárias, que são fonte de fundamentalismo, e ascendermos, por meio da tolerância e da reconciliação, em direção a relações pacíficas entre culturas diferentes. A resposta concreta aos desafios do diálogo está em dar voz a novos atores – mulheres, jovens, comunidades indígenas, minorias étnicas – por meio de políticas educativas e da valorização das línguas maternas, da cultura, das artes e do patrimônio.

Por sua notável diversidade cultural e criativa, pela reconhecida relação pacífica com outras nações e pela projeção internacional alcançada, acredito que o Brasil tem condições de desempenhar um papel relevante nesse movimento global pela aproximação entre culturas. Ao sediar no Rio o III Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, o País já demonstra uma contribuição à ONU na promoção da confiança e da compreensão entre comunidades heterogêneas e na construção da paz.


(*) Irina Bokova é Diretora-Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Publicado originalmente pelo jornal ‘O Globo’ no último domingo (30/06).