Medidas do Conselho de Segurança contra terrorismo não têm base legal, afirma especialista independente da ONU

Relator Especial Martin Scheinin. Foto: ONU.Um especialista independente da ONU em direitos humanos declarou que o regime criado pelo Conselho de Segurança para combater o terrorismo está fora do âmbito das suas competências. Ele pediu ao organismo que sistematize suas medidas de luta contra o terrorismo e os deveres de informação dos Estados sob um marco legal único.

Em seu relatório anual, apresentado à Assembleia Geral na última segunda-feira (25/10), Martin Scheinin, Relator Especial sobre a promoção e proteção dos direitos humanos e liberdades fundamentais no combate ao terrorismo, disse que as obrigações na luta contra o terrorismo impostas aos Estados-Membros pela resolução 1373 do Conselho de Segurança, aprovada na sequência dos ataques terroristas aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, “forma uma medida quase-legislativa que é ilimitada no tempo e no espaço.”

Scheinin afirmou que qualquer que seja a justificativa que o Conselho possa ter tido em setembro de 2001 para adotar a resolução, “a sua aplicação continuada nove anos depois não pode ser vista como uma resposta adequada a uma ameaça específica para a paz e segurança internacionais. A Resolução 1373 (2001) vai além dos poderes conferidos ao Conselho de Segurança e continua a apresentar riscos para a proteção de uma série de normas internacionais de direitos humanos”, escreveu.

Scheinin, um professor finlandês com extenso conhecimento e prática em direito internacional público e jurisdição dos direitos humanos, designado como Relator Especial em julho de 2005, argumentou que é problemático impor obrigações de ligação permanente para atos de terrorismo que ainda não aconteceram porque não existe uma definição universalmente aceita e precisa de terrorismo. Ele também citou problemas com o regime de sanções à Al-Qaeda e ao regime talibã pela resolução 1267 de 1999 do Conselho, apresentada há 11 anos como “uma forma de sanções inteligentes contra um grupo definido de pessoas e limitada no tempo e no espaço”, declarou a repórteres em uma conferência em Nova York.

“Enquanto a Resolução 1267 (1999) poderia ser vista como uma medida de emergência temporária pelo Conselho de Segurança, usar os poderes do Capítulo VII para manter uma lista permanente de indivíduos e entidades terroristas em todo o mundo e impor a sua aplicação a todos os Estados-Membros como uma obrigação da Carta juridicamente vinculativa ultrapassa as competências do Conselho de Segurança”, acrescentou.

Elogiando as medidas tomadas pelo Conselho para a reforma da lista de terroristas e a retirada da lista de alguns procedimentos, Scheinin constatou que o processo judicial adequado permanece em xeque. “É essencial que os indivíduos e entidades tenham acesso aos tribunais nacionais para impugnar qualquer medida de execução das sanções que sejam resultado de decisões políticas tomadas pelos diplomatas”.

O Relator Especial, que encerra suas funções em julho de 2011, pediu ao Conselho que aproveitasse a oportunidade do décimo aniversário da 1373 para substituir tanto esta resolução quanto a resolução 1267 por uma única resolução – não aprovada nos termos do Capítulo VII da Carta – para sistematizar as medidas de combate ao terrorismo e relatar as obrigações dos Estados em um único marco legal. Essa resolução deve incluir disposições explícitas dos direitos humanos e reafirmar a obrigação das Nações Unidas de cumprir os direitos humanos internacionais.

Scheinin destacou que, tal como reafirmado na Estratégia Global de Contraterrorismo das Nações Unidas aprovada pela Assembleia Geral, medidas eficazes de combate ao terrorismo e a proteção dos direitos humanos não são objetivos contraditórios, mas complementares e se reforçam mutuamente. “Os esforços da defesa dos direitos humanos torna os esforços de contraterrorismo dos Estados ainda mais eficazes. Violações dos direitos humanos pelos Estados são apenas conducentes para fornecer mais terreno para o terrorismo”, disse Scheinin, que fez seu relato ao Conselho de Direitos Humanos sediado em Genebra. Nas Nações Unidas, especialistas como Martin Scheinin exercem tal atividade de modo independente e não remunerado.