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Busco respeito e liberdade de poder amar, ser e sentir, diz refugiada no Dia Nacional da Visibilidade Lésbica

A moçambicana Lara, 36 anos, foi forçada a deixar seu país em função da sua orientação sexual e encontrou no Brasil a proteção necessária para construir um futuro melhor. Foto: Acervo pessoal

Foi graças a uma telenovela exibida em 2004 que a moçambicana Lara Elizabeth, 36 anos, vislumbrou pela primeira vez um futuro mais próspero. A obra retratava um casal de lésbicas que tinha receio de se assumir por medo da reação dos familiares. Para Lara, a situação extrapolava a ficção: aquela era uma realidade vivida por ela todos os dias.

Apesar de ter deixado Moçambique em 2013, Lara ainda guarda memórias vivas de sua cidade natal, Maputo. Ela lembra com carinho dos jogos disputados com os poucos amigos nos campos de areia, do sabor das mangas colhidas no pé e das conversas no quintal da avó. Por ser filha única, sua mãe a deixava na casa dos avós para que pudesse brincar com as outras crianças do bairro.

Ao passo que Lara foi crescendo, as recordações de uma vida feliz em seu país foram adquirindo um tom mais opaco. “Tudo mudou quando comecei a mostrar sinais de que eu não era ‘aquela mulher’ que todo mundo imaginou que eu fosse”.

Os primos de Lara começaram a isolá-la. Um de seus tios começou a assediar as parceiras que teve – na época, Lara as apresentava como amigas por medo das reações dos parentes. O cenário ficou ainda pior quando o pai de Lara abandonou a família por não aceitar a orientação sexual da filha. “Pensei que estava destruindo a minha família. Não tinha nenhuma base para falar sobre homossexualidade, e aquilo mexeu muito comigo. Para eles, era como se eu tivesse uma doença contagiosa”.

A reação da família de Lara era também um reflexo do que ela precisava lidar no âmbito social. “Onde quer que eu fosse, precisava baixar a cabeça e fingir que aquilo que estavam falando não era comigo. Nunca me senti realmente à vontade para ser eu mesma”. Mesmo na universidade, Lara conta como alguns professores incitavam a homofobia de um modo violento.

Segundo dados do ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, mais de 70 países ainda criminalizam relações entre pessoas do mesmo sexo. Em alguns deles, a punição pode ter como sentença a pena de morte. Em outros, leis legitimam discriminação e violência contra pessoas LGBTQIA+.

Veja também: Brasil protege refugiados LGBTI, mostra levantamento inédito do ACNUR e do Ministério da Justiça

Em 2004, na tela de uma televisão, Lara vislumbrou um futuro mais próspero. “Assisti uma novela brasileira chamada Senhora do Destino, que retratava um casal de lésbicas com receio de se assumir por medo da reação dos familiares. E eu vivia a mesma coisa”.

Foi então que ela começou a pesquisar sobre o Brasil. “Percebi que era um país em que se falava sobre a homossexualidade. Essa novela foi como uma luz no fim do túnel”, afirmou Lara. Depois disso, ela passou a juntar todo o dinheiro que ganhava como técnica de recursos humanos com um objetivo: deixar para trás o peso de não poder ser quem realmente era. Em 2013, ela subiu em um avião com destino a São Paulo.

Do outro lado do oceano atlântico, Lara enfrentou desafios até então desconhecidos. ‘‘Eu tinha tudo para desistir. Já fiquei sem lugar para dormir e sem ter o que comer. Cheguei a pensar ‘poxa, eu tenho uma cama em Moçambique, tenho ensino superior’, mas eu não poderia voltar para um povo que não me olha como uma pessoa. Recomeçar do zero me fez uma pessoa mais forte e eu tenho muito orgulho de não ter desistido’’, diz com um orgulhoso sorriso no rosto.

Lara contou com o apoio da Missão Paz, organização parceira do ACNUR, para recomeçar sua vida no Brasil, mas foi somente um ano depois de sua chegada que ela falou sobre o real motivo de ter deixado o seu país natal. Após uma conversa com um funcionário do ACNUR, Lara sentiu-se empoderada para assumir sua orientação sexual. “Ele me disse que eu não precisava ter medo, e isso foi decisivo para que eu tivesse coragem de, pela primeira vez, falar em público sobre a minha história. Foi como tirar um peso das minhas costas”.

Lara conta sua trajetória em evento sobre a cultura de Moçambique. Foto: Acervo pessoal

Ressignificando o passado, construindo o futuro

Em março deste ano, Lara realizou o sonho de ser mãe junto a sua companheira, que conheceu quando ainda morava em Moçambique. “Sou muito religiosa, não gosto de ver famílias desunidas e sempre quis ser mãe, mas em Moçambique esse era um sonho distante. Foi o Brasil que me deu essa possibilidade. Essa criança é como um milagre”.

Mas vivendo no Brasil há sete anos, Lara ainda enfrenta desafios. Ela continua atravessando dificuldades para encontrar emprego, mesmo com uma nova graduação em Gestão de Tecnologia da Informação. Desempregada, ela pensa no dia em que conseguirá um trabalho que a ajude a realizar o sonho da casa própria.

Enquanto isso, Lara dá palestras para professores da rede municipal por meio de um projeto do Sesc-SP, sobre como lidar com alunos refugiados homossexuais. Em paralelo, ela vai desenhando para o filho uma educação sem tabus. Ela acredita na potência de falar abertamente sobre a homossexualidade como fator de mudança.

“Contar a nossa própria história para ele já vai servir de base para sua educação. Eu não quero que ele sofra bullying por ser filho de duas mulheres que são africanas e refugiadas”, explicou. “Muitas vezes as pessoas têm preconceito por pura ignorância. Há também as pessoas que acham que lésbicas só são lésbicas porque ainda não encontraram o homem certo, mas é pelo diálogo que você consegue mudar mentes e corações. Se você pode partilhar o que você passou e superou, alguém que esteja enfrentando desafios parecidos pode ver uma luz no fim do túnel”.

É olhando para este feixe de futuro que ela faz votos ao que deixou para trás. “Estou em um país que não é o meu e sonho que Moçambique tenha um terço daquilo que o Brasil tem, ainda que não seja um país perfeito. Quando falo de mim e vejo que as pessoas têm empatia, tenho ainda mais certeza de que as escolhas que fiz não foram erradas. Ser mulher, lésbica, negra e refugiada é um desafio diário porque você nunca sabe o que te espera. Posso não saber tudo, mas sei que tenho direitos, e eu preciso que o mundo saiba quais são eles. Eu não busco mais aceitação, eu busco respeito e liberdade de poder amar, ser e sentir”.

Dia Nacional da Visibilidade Lésbica

O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica foi criado em 1996 no Rio de Janeiro, durante o 1º Seminário Nacional de Lésbicas (o SENALE, atualmente SENALESBI – Seminário Nacional de Lésbicas e mulheres Bissexuais). Desde então, a data é celebrada nacionalmente em 29 de agosto e tem o objetivo de chamar atenção para os desafios enfrentados para a concretização dos direitos humanos de lésbicas.

ARTIGO: Como você sobreviveria em seu país se não tivesse prova de sua existência?

Crianças rohingya brincam no campo de refugiados de Kutupalong, em Bangladesh. Foto: ACNUR/Roger Arnold
Crianças rohingya brincam no campo de refugiados de Kutupalong, em Bangladesh. Foto: ACNUR/Roger Arnold

Por Khaled Hosseini*

Pergunte a si mesmo: como você sobreviveria em seu país de origem se não tivesse prova de sua cidadania ou mesmo de sua existência? Como seus filhos cresceriam com acesso mínimo a uma escola ou mesmo a um hospital?

O que você faria se um dia, após anos de discriminação, sua cidade natal fosse atacada por homens armados? Seus vizinhos mortos enquanto seus filhos olham? Casas totalmente queimadas? Se você é rohingya, você pega seus filhos, pega os pertences que pode carregar e corre para salvar sua vida.

Três anos atrás, foi exatamente isso o que centenas de milhares de rohingya traumatizados tiveram que fazer. Lembro-me de assistir com horror imagens de famílias rohingya fugindo de Mianmar, caminhando descalças pelos campos de arroz, suas vidas nas costas, deixando para trás suas casas, seus meios de subsistência, seus mortos e os amigos e entes queridos muito velhos, muito fracos ou muito abatidos para seguir. Eles chegaram à fronteira exaustos, feridos, traumatizados e precisando de atendimento urgente.

No entanto, mesmo enquanto escrevo isto, estou ciente de que muitas histórias de refugiados se concentram em trauma e fuga. Muitas vezes, no imaginário popular, um refugiado é uma pessoa vulnerável, indefesa, que foge da violência e precisa desesperadamente de resgate.

Essa é uma narrativa incompleta da história e mais uma injustiça com os seus protagonistas. Embora os refugiados de fato precisem de proteção, eles são definidos muito menos por sua condição de beneficiários de cuidados do que por sua insondável coragem, resiliência e desejo de autossuficiência. Isso é verdade para todas as comunidades de refugiados que visitei, sejam sírios, afegãos ou sul-sudaneses, e certamente é verdade para os rohingya.

Desde o início, os refugiados rohingya em Bangladesh assumiram papéis essenciais de liderança na resposta humanitária ao seu próprio sofrimento. Com o apoio do ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, e de ONGs parceiras, eles formaram um modelo de proteção baseado na comunidade, dando aos refugiados a oportunidade de ter um certo controle sobre suas próprias vidas e aprender novas habilidades. O modelo deu protagonismo a todos os membros da comunidade rohingya.

Isso foi antes da pandemia do novo coronavírus. O surto de COVID-19 provocou uma redução de 80% dos trabalhadores humanitários nos campos. O papel dos voluntários comunitários rohingya tornou-se, portanto, ainda mais essencial.

Como ex-médico, estou impressionado com os trabalhadores comunitários de saúde refugiados que arregaçaram as suas mangas e se voluntariaram para atender às necessidades de sua comunidade. Eles trabalharam juntos para reduzir o risco de transmissão viral e, dadas as circunstâncias, é nada menos que inspirador.

Veja Salma, de 19 anos, por exemplo. Ela é voluntária de saúde comunitária no campo de refugiados de Kutupalong. Antes da pandemia, ela participou de um programa de voluntariado intergeracional – metade do qual é composto por meninas e mulheres – para fornecer suporte de saúde, incluindo cuidados pré e pós-natal para mulheres e bebês no campo.

Mas, nos últimos meses, ela voltou suas responsabilidades para a resposta à COVID-19. Junto com mais de 1,4 mil outras pessoas, Salma agora promove a lavagem e higiene das mãos. Ela educa a comunidade sobre como o vírus se espalha, como reconhecer os sintomas e buscar atendimento, além de garantir que aqueles que apresentarem os sintomas sejam testados.

Apesar dos desafios de viver em um campo de refugiados densamente povoado, Salma e seus colegas voluntários fizeram uma diferença vital em sua comunidade. No final de julho, havia menos de 100 casos confirmados de COVID-19 entre a população de refugiados rohingya.

Acho isso muito comovente, porque não é muito difícil ver como o trabalho de Salma, do outro lado do mundo, é de fato crítico para o bem-estar e a segurança de minha própria família aqui na América. Visto que uma coisa que todos nós aprendemos nesta pandemia é que ninguém estará seguro contra este vírus até que todos nós estejamos.

Estou comovido e inspirado pela resiliência dos refugiados rohingya. Eles são sobreviventes. Eles escaparam de horrores indescritíveis, fizeram a longa e dolorosa jornada para Bangladesh e superaram as muitas dificuldades da vida nos campos.

Eles continuam a mostrar força em manter a esperança e o compromisso de voltar para casa, contra todas as probabilidades. E agora, a cada dia, sob a sombra de uma pandemia, eles estão trabalhando, liderando, curando e desafiando nossa ideia de “quem é um refugiado”.

*Embaixador da Boa Vontade da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e autor de vários best-sellers internacionais, incluindo “O Caçador de Pipas” e “A Memória do Mar”

Projeto apoiado pela OIM dá capacitação profissional online para migrantes em SP

OIM está fornecendo assistência alimentar a refugiados e migrantes venezuelanos da região Sudeste. Foto: OIM
OIM também fornece assistência alimentar a refugiados e migrantes venezuelanos da região Sudeste. Foto: OIM

Durante três meses, o projeto Autonomia Migrante, iniciado neste mês e promovido pelo Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante (CDHIC) com o apoio financeiro da Organização Internacional para as Migrações (OIM), irá capacitar 100 venezuelanos e migrantes de países vizinhos ao Brasil residentes nas cidades de São Paulo, Guarulhos e municípios adjacentes.

O intuito é contribuir para a integração econômica sustentável dos beneficiários com aulas em direito civil e trabalhista, assim como inovação e desenvolvimento profissional.

Durante a formação online, formato adaptado para dar mais segurança durante a pandemia, os alunos terão garantidos recursos tecnológicos e financeiros de modo a viabilizar o acesso integral à formação.

Dessa forma, tablets para o acompanhamento dos cursos serão disponibilizados, assim como um auxílio em dinheiro. A bolsa, no valor de 300 reais para jovens de 15 a 17 anos e de 600 reais para pessoas acima de 18 anos, ajudará com custos diversos, como para financiar o pacote de dados móveis.

Além da formação e do auxílio durante o período das aulas, o Autonomia Migrante traz uma perspectiva de inserção econômica qualificada dos participantes. Esse eixo do projeto buscará ativamente postos de trabalho, além de promover a conscientização sobre a contratação de migrantes junto a empresas, sindicatos e órgãos públicos.

Parcerias com o organismo internacional Solidarity Center, Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Sindicato dos Comerciários de Guarulhos, Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Prestação de Serviços de Asseio e Conservação e Limpeza Urbana de São Paulo já foram realizadas com o intuito de facilitar essa inserção laboral.

Essa visão integrada da autonomia dos beneficiários promovida pelo projeto, com formação, assessoria e empregabilidade, tem também o objetivo de mitigar os impactos econômicos e dificuldades de acesso ao mercado de trabalho durante e após a crise sanitária. Espera-se que o grupo selecionado tenha mais informação e acesso a postos de trabalho direcionados ao seu perfil após a conclusão do curso.

“O agravamento das condições sociais decorrente da pandemia de COVID-19 atinge diretamente as populações mais vulneráveis, como é o caso de muitos migrantes. Criar um projeto que, além de uma formação multidisciplinar e social ofereça plenas condições para que os selecionados tenham uma participação efetiva foi uma premissa fundamental do Autonomia Migrante”, ressalta a coordenadora-executiva do CDHIC, Thaís La Rosa.

“Essa visão integrada, que provê formação e atendimentos individualizados é uma das premissas do modelo de atuação do CDHIC, que é uma organização que trabalha por políticas migratórias mais justas, mas também pela promoção de atividades que gerem condições dignas de trabalho a essas pessoas”, complementa La Rosa.

O apoio da OIM nesta atividade é realizado no marco do projeto “Oportunidades – Integração no Brasil”, financiado pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID). São Paulo é um dos estados de atuação do projeto e possui o maior número de migrantes no país, sendo central para o desenvolvimento das ações e parcerias realizadas.

“Este tipo de iniciativa que estamos realizando com o CDHIC é muito importante para a OIM, pois permite a integração econômica de venezuelanos e migrantes de outros países vizinhos ao Brasil como uma solução duradoura e efetiva, facilitando o recomeço de suas vidas de forma independente. Dentro do projeto Oportunidades, da OIM e USAID, buscamos justamente fomentar esse tipo de ação”, destaca a gestora do projeto na OIM, Michelle Barron.

Os conteúdos da formação serão desenvolvidos e aplicados por profissionais do CDHIC e dos parceiros do projeto: União Geral dos Trabalhadores (UGT), Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), Espaço Cidadania do CIEE – Centro de Integração Empresa-Escola, e Consultoria de Inovação e Engenharia da Imaginação (Co-Viva).

UNFPA realiza ações de conscientização sobre proteção contra abuso e assédio em Roraima

As atividades em Boa Vista (RR) tiveram início no dia 17 de agosto com o primeiro efetivo do 9º Contingente que atuará na Força-Tarefa Logística Humanitária da Operação Acolhida. Foto: UNFPA Brasil/Pedro Jose Sibahi
As atividades em Boa Vista (RR) tiveram início no dia 17 de agosto com o primeiro efetivo do 9º Contingente que atuará na Força-Tarefa Logística Humanitária da Operação Acolhida. Foto: UNFPA Brasil/Pedro Jose Sibahi

O Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) está realizando ações de conscientização sobre Proteção contra Abuso, Assédio e Exploração Sexual com militares do 9º Contingente que atuará na Força-Tarefa Logística Humanitária da Operação Acolhida.

O trabalho do UNFPA em assistência humanitária é, sobretudo, direcionado à prevenção e resposta a violência baseada em gênero e, portanto, as sessões informativas e de sensibilização de parceiros é parte central do plano de ação da instituição em Roraima e Manaus.

As atividades em Boa Vista (RR) tiveram início no dia 17 de agosto com o primeiro efetivo do Contingente, além de outros encontros nos dias 22, 23 e 24. O objetivo da atividade é sensibilizar os militares para que entendam essas práticas nas suas nuances, além de buscar comprometê-los com o enfrentamento ao abuso, assédio e a exploração sexual.

Ainda são previstos encontros nos dias, 26, 28 e 30 de agosto, e 1º de setembro. Em Pacaraima (RR), cidade de fronteira com a Venezuela, ainda é previsto um encontro no dia 4 de setembro. A atividade interagencial é liderada pelo UNFPA em parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e conta com a participação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e da Organização Internacional de Migração (OIM).

Na atividade de sensibilização em Proteção contra Abuso, Assédio e Exploração Sexual, as equipes do UNFPA e do ACNUR abordaram temas como os conceitos de abuso, assédio e exploração sexual, assim como as sanções sobre qualquer envolvido nesse tipo de comportamento, assim como os desafios no enfrentamento dessas práticas.

O contingente também recebeu informações sobre medidas  que devem ser adotadas visando prevenir a exploração, o assédio e o abuso sexual, especialmente com relação a denúncia de qualquer caso, ainda que seja apenas uma suspeita.

Também durante os encontros, assistentes de campo do Fundo de População da ONU explicaram o mandato da instituição na Operação Acolhida, com foco em garantir que toda gravidez seja planejada, que todo parto seja seguro e que toda pessoa jovem desenvolva seu pleno potencial.

Também foram abordadas as atividades de disseminação de informações voltadas para mulheres, jovens e crianças, além do acolhimento e escuta de vítimas de violência baseada em gênero. Outro tema tratado foi o papel do UNFPA nos Postos de Triagem (PITRIG), de orientação para acesso a direitos e distribuição de insumos para prevenção a Infecções Sexualmente Transmissíveis.

Segundo a assistente de campo do UNFPA, Elayne Sartori, disseminar os princípios de proteção contra o abuso, assédio e exploração sexual é essencial para que todos os atores humanitários compreendam o seu papel neste objetivo e para que seja possível garantir os direitos e dignidade das pessoas atendidas.

A Proteção contra Exploração, Abuso, Assédio e Exploração Sexual (PSEAH) é de total relevância para o Sistema das Nações Unidas e seus parceiros, e tem ganhado cada vez mais atenção do Secretário-Geral e da Diretora-Executiva do UNFPA para suas atividades.

Em colaboração com os parceiros do sistema das Nações Unidas, o UNFPA está implementando uma estratégia de PSEAH em toda a organização por meio de uma série de ações coordenadas para fortalecer a prevenção, a resposta e a gestão de casos.

Aumenta número de mulheres refugiadas atendidas pela Caritas em São Paulo

Mulher venezuelana recebe donativos da Caritas São Paulo, após agendamento virtual realizado via aplicativo pela organização parceira do ACNUR. Foto: Miguel Pachioni/ACNUR

No primeiro semestre de 2020, o Centro de Referência para Refugiados da Caritas Arquidiocesana de São Paulo (CASP) atendeu 3.882 pessoas de 73 nacionalidades. Entre as nacionalidades mais atendidas, 52% são pessoas da Venezuela, 7% da República Democrática do Congo, 6% da Síria e 6% da Colômbia.

Pela primeira vez, o percentual de mulheres atendidas se equiparou ao de homens, com índices crescentes nos últimos três anos: em 2018, 33% das pessoas atendidas no primeiro semestre eram mulheres; em 2019, 43%. No primeiro semestre de 2020, as mulheres representaram 48% dos atendimentos.

Esses dados foram apresentados nesta quarta-feira (26), em uma live realizada pela CASP em parceria com a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR).

Mesmo com as atividades presenciais reduzidas devido à pandemia do novo coronavírus, o trabalho na organização incorporou agendamentos e atendimentos virtuais, ampliando o alcance das pessoas assistidas.

“O perfil de deslocamento forçado fronteiriço, decorrente do contexto da Venezuela, mudou o perfil das pessoas em situação de refúgio no país e em São Paulo, dialogando com os fluxos globais”, afirmou a chefe do escritório do ACNUR em São Paulo, Maria Beatriz Nogueira.

“Temos recebidos mais famílias estendidas, inclusive famílias monoparentais, lideradas por mulheres, diferentemente de quando as chegadas ao Brasil se davam principalmente pelos aeroportos”.

As principais demandas das pessoas em situação de refúgio atendidas pela Caritas foram: pedidos urgentes de alimentos, itens de higiene e limpeza, apoio financeiro (em grande parte para pagamento de aluguel), apoio para reinserção no mercado de trabalho e orientações para regularização migratória.

A venezuelana Karen Moreira reflete bem esta realidade. Ela chegou ao Brasil há dois anos e, durante a pandemia, a situação econômica agravou sua situação de vulnerabilidade. Karen recebeu cesta básica, itens de higiene e máscaras de pano após agendamento online.

“Este momento está sendo muito difícil, mas o atendimento e a entrega de produtos feita pela Caritas e pelo ACNUR têm contribuído para que nossa vida fique um pouco mais tranquila. Pouco a pouco, vamos dando um jeito, sendo um passo por vez, porque a situação para todos nós não está fácil”, ressaltou.

A dificuldade enfrentada por Karen é a mesma de outras pessoas refugiadas de diferentes nacionalidades e experiências profissionais: encontrar fontes de geração de renda e trabalho.

“O desemprego atingiu em cheio a população refugiada e se tornou um gatilho para muitas crises, desde questões econômicas e financeiras até temas de saúde mental e garantia de direitos”, afirmou o diretor da CASP, padre Marcelo Marostica Quadro.

“No prolongamento das crises que vivemos em nossos tempos, percebemos o agravamento da situação de vulnerabilidade dessa população”.

As crianças e adolescentes venezuelanas atendidas pela Caritas representaram 31% dos novos atendimentos realizados no mesmo período, seja pelas chegadas espontâneas ou promovidas pelo programa de interiorização do Governo Federal.

O registro de pessoas em situação de vulnerabilidade também se ampliou: entre o perfil dos atendidos, houve 126 famílias monoparentais, sendo a maioria (119) chefiada por mulheres; 18 mulheres grávidas, sendo oito delas chefes de famílias monoparentais; 19 pessoas LGBTIQ+ e 25 idosos.

Os quatro programas que integram o Centro de Referência para Refugiados da CASP (Assistência, Integração, Proteção e Saúde Mental) há mais de 30 anos contam com o apoio do ACNUR e estabelecem confiança e a segurança das pessoas atendidas. Com a chegada da pandemia da COVID-19, o atendimento presencial, tido como opção preferencial pela organização, também passou a ser feito no modelo remoto, mantendo o padrão de escuta e aconselhamento em cinco idiomas: português, espanhol, inglês, francês e árabe.